A cada dia, quase três animais são vítimas de maus-tratos no estado de Minas Gerais. A estatística que comove quem gosta dos bichos e revolta entidades protetoras levou organizações não governamentais mineiras a reivindicar a criação de uma delegacia de proteção animal, como já ocorre em outros estados. Depois de receber documento com 56 mil assinaturas, em setembro, o governo de Minas já autorizou a criação de uma unidade em Belo Horizonte. Segundo a Polícia Civil, o projeto da delegacia está na fase final de estudos para definir a data de início de funcionamento.
Trabalho para investigadores não vai faltar. Em 2012, até setembro, foram 743 casos registrados pela Polícia Civil, 66 deles na capital e 92 na Grande BH, número já superior ao do ano passado. Ativistas destacam, no entanto, que este é um crime subnotificado, em que muitas vezes nem sequer é possível identificar o agressor, a exemplo de um cachorro encontrado morto em Caeté. O animal teve as patas quebradas e há a suspeita de que foi violentado. A polícia ainda tenta descobrir quem é o criminoso.
Semana passada, um caso na cidade do Rio de Janeiro também ganhou repercussão: câmeras de segurança de um petshop flagraram o filho da proprietária espancando cães durante o banho. As denúncias, segundo protetores de animais, são variadas. Desde vizinhos que envenenam bichos de casas próximas, donos que abandonam seus animais nas ruas, falta de cuidados em clínicas veterinárias e petshops, além de violência gratuita contra cães e gatos, principalmente. São situações assim que a futura delegacia vai apurar. A pena para maus-tratos é de três meses a um ano de prisão, mas a comissão de reforma do Código Penal aprovou proposta que amplia o tempo para um a quatro anos de reclusão, chegando a seis se houver morte do animal.
Reação
A criação de uma delegacia específica anima quem lida com bichos maltratados, como a dona de casa Stela Maria Ferreira de Carvalho, de 47 anos. Mais de 100 cães recolhidos nas ruas da capital já passaram pelas mãos dela, que dedica parte do seu tempo para cuidar dos animais abandonados. Na casa onde mora, no Bairro Sagrada Família, Região Leste, ela mantém sete cachorros, todos vítimas de maus-tratos por parte de ex-donos. “Quando encontro esses animais, eles estão doentes, magros e em depressão. A grande maioria já teve um dono antes e que foi largada”, conta.
Stela alimenta os animais recolhidos, banca exames e a castração antes de enviá-los para adoção. Stela é exigente na hora de liberar os bichos. “Faço entrevista com os candidatos. Se perceber que a pessoa não vai cuidar bem, não deixo levar”, afirma. “Animal de estimação é quase como um filho. É para o resto da vida dele e exige dedicação”, defende. Dos vários anos dedicados ao cuidado com animais, a dona de casa acumula histórias marcantes, como a de uma cadela abandonada pelo dono por causa de tumores na mama e na boca.
A presidente da ONG Cão Viver, Mariza Catelli, é dura quando fala de agressores. Segundo ela, a entidade recebe cerca de 10 e-mails diários com pedidos de socorro e de orientações de pessoas que presenciam maus-tratos contra animais. “Geralmente contam que viram o vizinho maltratar o bicho, ou que ele se mudou e deixou o animal amarrado sem comida e sem água. São relatos muito tristes”, lembra.
Esse comportamento, na avaliação dela, sugere má formação de caráter ou de falta de educação ambiental em casa. “É desumano, uma monstruosidade. Se a pessoa não pode mais ficar com o animal, deve procurar alguém para adotá-lo. As redes sociais são hoje muito eficientes e as ONGs também”, defende. Segundo Mariza, a entidade cuida de 115 cães e 28 gatos, mas recebe cerca de 35 animais recolhidos por mês, conseguindo novos lares para uma média de 30. Advogados voluntários, segundo ela, ajudam a encontrar soluções para casos de negligência e maus-tratos.
Problemas também em pet shops
Casos que ocorrem em pet shops também ser enquadrados como maus-tratos. Mas ativistas alertam que é importante registrar ocorrência. A bancária Cristina Gomidi, de 51 anos, teve um problema do tipo. Quando conversou com advogados sobre a situação de Lindinha, sua Scottish Terrier, ela acabou desestimulada a recorrer contra uma pet shop do Bairro Cidade Nova porque não fez registro policial. A cadela tinha problema de ossos tortos por conta de um atropelamento, mas andava normalmente. Quando foi devolvida pela pet shop, estava com a pata deslocada. “Eles (da pet shop) vieram buscar Lindinha para o banho. Vizinhos viram quando a cadela saiu do prédio, numa boa. Mas, na volta, o rapaz do táxi dog entregou ela nos braços, com a pata deslocada fora do quadril. Ela agora faz acupuntura para voltar a andar, mas tem muita dificuldade”, conta a bancária. “Não fiz denúncia porque não estava em casa e a petshop colocou a culpa na minha empregada. Mas soube que ela tinha sofrido maus-tratos quando os moradores disseram que viram minha cachorrinha bem ao sair. É uma enorme sensação de impotência”, diz Cristina.
ATAQUES A ANIMAIS
Ocorrências de maus-tratos a animais em Minas
Belo Horizonte
2009: 93
2010: 110
2011: 82
2012 (até setembro): 66
Grande BH
2009: 76
2010: 89
2011 : 89
2012 (até setembro): 92
Minas Gerais
2011: 762
2012 (até setembro): 743
Fonte: Estado de Minas