Todos os dias, cerca de 200 mães recebem correspondência com convocação para que compareçam perante o Tribunal de Justiça do estado de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Essas intimadas nunca chegam sozinhas para a audiência no Centro de Reconhecimento de Paternidade (CRP), na Avenida Álvares Cabral, 200, quinto andar, no Centro da cidade. Seus acompanhantes costumam vir no colo ou de mãos dadas, dependendo da idade. São recebidos com carrinhos de plástico, casinha de bonecas e com a tevê ligada durante todo o tempo no canal de desenhos animados. O ambiente acolhedor em nada lembra os frios e imponentes palácios de granito da Justiça.
Na recepção, as cadeiras na cidade de Belo Horizonte são insuficientes nas manhãs de segunda-feira a quarta-feira, quando ocorrem as audiências com o juiz e as reuniões de conciliação entre os casais. “Ali está o fruto de um romance do carnaval passado”, aponta uma funcionária, discretamente. Sentados lado a lado, visivelmente desconfortáveis, estão homem e mulher, que mal se reconhecem. No meio, está o bebê de quase 1 ano, no colo da avó materna. O menino, com traços visivelmente semelhantes aos do provável pai, não parece se importar com a seriedade do momento. Tem o sorriso aberto e adora brincar.
Pioneiro no país, o Centro de Reconhecimento de Paternidade de Belo Horizonte foi criado em agosto de 2010. É o único a oferecer testes de DNA gratuitos e o próprio sistema de informática, integrado a todos os cartórios da capital. Só no ano passado, foram abertos 7.377 pedidos de reconhecimento de paternidade. Destes, em 4.029 casos, ou seja, mais da metade (54%), as crianças já podem dizer o nome do seus pais biológicos. Do total, 2.247 pais aceitaram fazer o reconhecimento espontâneo. Dos 2.375 que exigiram o teste de DNA, 75% tiveram resultado positivo (1.782).
Ao ser chamados a comparecer em audiência, mãe e pai já saem com o registro pronto, se houver consenso. Se o suposto pai exigir o DNA, são necessários 30 dias. “É muito rápido e a tramitação evita a necessidade de constituir advogado e pagar pelo teste de paternidade. Antes do CRP, muitas mães desistiam antes de tentar”, afirma o coordenador do centro, Bruno Campos da Cruz.
Em BH, o processo está mais adiantado em relação às outras capitais. Começou em 2009, desde que o Censo Escolar apontou a existência de 43,7 mil estudantes de até 18 anos que não tinham pais conhecidos no estado. “Não era apenas uma estatística. Tratava-se de uma lista de quase 50 mil crianças e adolescentes, com o nome das mães e o endereço das casas onde moravam. Passamos a procurar essas pessoas por meio de cartas”, explica o juiz Fernando Humberto dos Santos, titular da Vara de Registros Públicos e desembargador aposentado do TJMG.
Com o estímulo dos testes gratuitos de paternidade junto à Universidade Federal de Minas Gerais, obtidos por intermédio do então juiz da 3ª Vara de Família, Reinaldo Portanova, nascia o embrião do projeto “Pai presente: o reconhecimento que seu filho merece”. O juiz Fernando Humberto dos Santos foi a Brasília mostrar a iniciativa à então corregedora nacional, Eliana Calmon. Em 2010, a Corregedoria estendeu o Pai presente a todo o país, por meio do Provimento 12, determinando que os cartórios passassem a informar aos juízes os registros em que não constasse o nome do pai da criança.
Registre que o filho é seu
Milhares de pais foram oficializados em 2012 pelo Centro de Reconhecimento de Paternidade de BH
Procedimentos abertos 7.377
Paternidades reconhecidas 4.029 54,6%
Reconhecimento espontâneo 2.247 30,5%
Procedimentos suspensos 1.101 14,9%
Pedidos de exame de DNA 2.375 32,1%
– Positivos 1.782 75%
– Negativos 593 25%
Fonte: Em.com.br